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Do coronavírus a febre amarela e Influenza, a importância da vigilância genômica para conhecermos os vírus que nos rodeiam

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Uma profissional de saúde manuseia o equipamento que realiza o processo de sequenciamento genômico parcial.
Equipamento que realiza o processo de sequenciamento genômico parcial. - Foto: Marília Bissigo/Divulgação SES

Desde a coleta de uma amostra para a realização de exame diagnóstico para covid-19 até a confirmação de qual variante do coronavírus se trata cada caso há uma rede de profissionais, tecnologias e insumos altamente qualificados e específicos, que inclui, especialmente, o exame de biologia molecular RT-PCR e sequenciamento genético do vírus. A Secretaria da Saúde (SES), nos laboratórios do Centro Estadual de Vigilância em Saúde (Cevs), - Laboratório Central do Estado (Lacen/RS) e Centro de Desenvolvimento Tecnológico e Científico (CDCT) – realiza esse trabalho de diagnóstico do coronavírus e identificação de variantes, por meio de vigilância genômica, desde início da pandemia no território gaúcho, em março de 2020, em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), do Rio de Janeiro.

De acordo com a especialista em saúde do Cevs Tatiana Schäffer Gregianini, no entanto, o uso dessas tecnologias não é novidade, nem no Estado, nem no país. “A caracterização genética dos vírus respiratórios é um trabalho que já existe em rede nacional desde antes do coronavírus, para reunir informações sobre Influenza, adenovírus e vírus sincicial respiratório, por exemplo.” Com o advento do coronavírus, a vigilância genômica do Cevs, assim como de outros laboratórios pelo país, foi reforçada e ampliada, para dar conta da demanda trazida pela pandemia e a necessidade de informações sobre o vírus. “Para isso, aumentamos o número de profissionais e de laboratórios parceiros”, disse Tatiana. Além disso, a etapa de sequenciamento genômico completo passou a ser realizado nos laboratórios do Cevs desde novembro de 2020. Até o momento, no Cevs, a tecnologia está sendo utilizada para o coronavírus e para a febre amarela, enquanto outros vírus seguem o fluxo nacional para a Fiocruz (centro de referência que atende a demanda do Rio Grande do Sul).

Uma profissional de saúde manuseia amostras de secreção do nariz e boca de pacientes com suspeita de covid-19.
Amostras de secreção do nariz e boca de pacientes com suspeita de covid-19, antes de passar pelos exames diagnósticos. - Foto: Marília Bissigo/Divulgação SES

O que faz a vigilância genômica do coronavírus

A vigilância genômica do coronavírus consiste em identificar as variantes genéticas do vírus que estão em circulação no território gaúcho e identificar o quanto antes uma variante de preocupação começa a se espalhar pela população. Entre outras coisas, essas informações são importantes para os gestores públicos tomarem decisões de políticas públicas no enfrentamento da pandemia. Uma variante de preocupação (VOC, variants of concern na sigla em inglês) são aquelas que apresentam mutações genéticas que podem trazer alguma mudança no comportamento do vírus, como, por exemplo, torná-lo mais transmissível. No momento, a variante de preocupação mais comum no Rio Grande do Sul é a delta. “A vigilância genômica é um trabalho complementar e integrado à vigilância epidemiológica, uma vez que traz mais dados e informações sobre o comportamento dos vírus, e mesmo de bactérias”, falou Tatiana.

A imagem mostra frascos com amostras de secreção do nariz e boca de pacientes com suspeita de covid-19.
Amostras de secreção do nariz e boca de pacientes com suspeita de covid-19, antes de passar pelos exames diagnósticos. - Foto: Marília Bissigo/Divulgação SES
Coleta e diagnóstico
Quando uma pessoa faz a coleta de amostra de secreção do nariz ou da boca pode fazer um exame diagnóstico rápido ou de biologia molecular, o RT-PCR, feito em laboratório.

Primeiro, a amostra que chega ao laboratório é preparada para passar pelo processo de extração do RNA do vírus e limpeza do material genético. A etapa de extração pode ser feita de maneira manual ou por meio de um equipamento chamado extrator. O Cevs possui extrator desde setembro de 2020.

O RT-PCR é um exame padrão ouro para a definição de qual vírus está presente em uma amostra de secreção. Uma máquina, com ajuda de reagentes químicos, multiplica diversas vezes o material genético (RNA) do vírus coletado nesta amostra.

RT significa que é um vírus de RNA, e não DNA (transcrição reversa, na siga em inglês). Enquanto o PCR significa reação em cadeia da polimerase (na sigla em inglês) - polimerase é a enzima que faz as cópias do material genético. “Se a amostra de um paciente possui uma carga viral alta, o exame já inicia com muitas cópias do vírus e mais fácil e rápido será identificá-lo”, explica Tatiana.

Após o diagnóstico, como se define a variante
Os exames que resultam positivo para coronavírus e possuem carga viral alta podem passar por novos testes para se identificar qual variante se trata. “Para PCR e para sequenciamento é importante que se tenha muitas cópias de vírus, se não as técnicas não funcionam ou funcionam com qualidade indesejada”, falou Tatiana. O fluxo normal de trabalho é escolher algumas dessas amostras aleatoriamente para seguir ao próximo passo e fazer a caracterização da variante. Em tempos em que há uma nova variação do coronavírus circulando pelo mundo e existe o risco dessa cepa ingressar no Estado, no entanto, como foi o caso da delta e, agora, da ômicron, a vigilância genômica do Cevs é intensificada. Isso significa que todas as amostras que atendam aos dois critérios (positividade para coronavírus e carga viral alta) são submetidos aos testes para definição da linhagem.

Duas profissionais de saúde olham para uma tela de computador com informações.
Primeiro passo no processo de caracterização da linhagem de um vírus é passar por uma triagem inicial. - Foto: Marília Bissigo/Divulgação SES
1 - Triagem inicial
Primeiro passo é recolher o que é chamado de “nova alíquota”, ou seja, uma nova extração de RNA da amostra de secreção, como chegou primeiramente ao laboratório. Esse material genético passa novamente por um exame de RT-PCR, mas desta vez com sondas específicas para algumas mutações sugestivas da variação que se está buscando (delta ou ômicron, por exemplo), em vez de identificar apenas coronavírus de um modo geral. No caso do coronavírus, é analisada a proteína chamada Spike, que é a parte responsável por se ligar à célula humana, e também é a região em que parte das vacinas agem. As mutações na proteína Spike fazem, principalmente, com que o vírus se torne mais transmissível.

No caso da ômicron, a variação de preocupação que se está buscando no momento, esse teste busca uma mutação específica que não está presente na delta e nem na gamma, outras variações que estão em circulação atualmente no Estado. Se o exame encontrar a mutação, ela será considerada sugestiva para ômicron e passará ao próximo passo da investigação. “É realizado esse filtro inicial porque o sequenciamento genético é um processo laborioso e caro, e os insumos são difíceis de adquirir. Precisamos fazer uma peneira e ter certeza que estamos utilizando os reagentes de forma eficaz”, falou a especialista em saúde do Cevs, Regina Bones Barcellos.

Uma profissional de saúde manuseia o equipamento que realiza o processo de sequenciamento genômico parcial.
Equipamento que realiza o processo de sequenciamento genômico parcial. - Foto: Marília Bissigo/Divulgação SES
2 – Sequenciamento genômico parcial
O segundo passo é fazer o sequenciamento genômico parcial, realizado com outra tecnologia, chamado de método de sanger. “Esse exame mostra se há outras mutações sugestivas para a variação que estamos procurando. Ele mostra as diferentes combinações de mutações presentes na alpha, na gamma, na delta, ou, agora, na ômicron”, falou Regina. Já foram identificadas mais de 30 diferentes mutações na proteína Spike da ômicron, e isso a torna muito fácil de ser “reconhecida” a partir deste método de sequenciamento. “No pedacinho de material genético que sequenciamos no método de sanger é possível ver 12 dessas mutações. Quando as encontramos é um indicativo muito grande de que se trata desta cepa”, explica a especialista em saúde.

Uma profissional da saúde trabalha com um computador. Outras duas manuseiam frascos e equipamentos.
Equipe que trabalha nos laboratórios do Cevs no sequenciamento genômico completo. - Foto: Marília Bissigo/Divulgação SES
3 – Sequenciamento genômico completo
O sequenciamento parcial é um método mais barato que o sequenciamento genômico completo, mas não pode ser utilizada a fim de dar uma confirmação absoluta. Para isso, apenas o sequenciamento completo pode dar certeza da linhagem do vírus. E esse é o terceiro passo que a amostra passa para a caracterização completa do vírus presente nela. “O sequenciamento completo nos dá segurança total de dizer que se trata de uma única variante. Neste exame, são analisados diversos parâmetros e todas as regiões do genoma estão sequenciadas milhares de vezes”, completa Regina. Após recolher todas as informações, um programa de computador de bioinformática remonta o genoma. Com este arquivo, os pesquisadores podem abastecer bancos de dados internacionais de vigilância genômica do coronavírus e comparar, também por meio de bioinformática, com arquivos de todos os locais do mundo que também realizam o mesmo trabalho. Regina explica que os sites que os arquivos ficam hospedados possurm uma interface gráfica amigável que qualquer pessoa pode acessar. Lá se encontram informações como quais variantes já foram identificadas, quais mutações de cada uma, em quais países e com qual frequência já foram encontradas. São dois sites: o Gisaid.org e o CoVariants.org.

Uma profissional de saúde aponta para uma tela de computador com dados.
Após realizar o sequenciamento genético, os especialistas em saúde utilizam bioinformática para comparar as mutações presentes. - Foto: Marília Bissigo/Divulgação SES
A imagem mostra a mão de uma profissional de saúde apontando para dados de uma tela de computador.
Comparação entre o sequenciamento genômico da primeira amostra de coronavírus identificada no mundo e a variação ômicron. - Foto: Marília Bissigo/Divulgação SES
A imagem mostra as mãos de uma profissional de saúde manuseando o equipamento que realiza o processo de sequenciamento genômico completo.
Equipamento que realiza o processo de sequenciamento genômico completo. - Foto: Marília Bissigo/Divulgação SES

Febre Amarela
A partir de novembro deste ano, a equipe de pesquisadores do Cevs estão aptos para realizar o sequenciamento genômico completo também da febre amarela. Os dois equipamentos que existem no Cevs foram adquiridos no final de 2019, com objetivo inicial de utilizá-lo para esta doença. Porém, com a chegada do coronavírus, a força de trabalho foi deslocada para dar resposta rápida à pandemia. Se o Rio Grande do Sul apresentar algum caso positivo de febre amarela, será possível definir exatamente a linhagem do vírus.

Será possível, por exemplo, verificar se é o mesmo vírus que está avançando para diversos lugares ou se uma linhagem foi extinta e houve outra reintrodução. A análise da dinâmica das linhagens do vírus contribui para as ações de controle e de enfrentamento da doença.

Influenza

Os laboratórios do Cevs também realizam a vigilância genômica da Influenza (gripe). A caracterização do vírus tem o propósito de descobrir qual é a cepa que está circulando no momento, e passar a informação à Organização Mundial da Saúde. Em cima desses dados, são produzidas as vacinas que irão ser aplicadas no ano seguinte. São produzidas duas vacinas diferentes por ano, uma com as linhagens que mais circularam no hemisfério sul e outra com as linhagens que mais circularam no hemisfério norte. O sequenciamento genético completo da Influenza é realizado pela Fiocruz do Rio de Janeiro.

Outro objetivo de se conhecer o material genético da Influenza, explica a especialista Tatiana, é identificar a presença de mutações relacionadas à resistência à medicação disponível para a doença, o fosfato de oseltamivir, mais conhecido pelo nome comercial Tamiflu.

Por Marília Bissigo
Secretaria da Saúde