Carta Capital esconde entrevista do secretário Osmar Terra
Publicação:
A revista Carta Capital trouxe na edição desta semana (de 1º a 6 de março) matéria sob o título "Remédios por Juros", assinada pelo jornalista Leandro Fortes. Nela, o jornalista usa dados levantados pelo Denasus. A publicação omitiu deliberadamente as respostas fornecidas pelo secretário da Saúde do Rio Grande do Sul Osmar Terra, por razões puramente políticas.
Para que fique bem claro que o governo do Estado não tem nada a esconder ou omitir, abaixo segue a entrevista que foi escondida.
1) Segundo o relatório, o secretário de Saúde do RS, Osmar Gasparini Terra, negou à equipe do Denasus acesso aos documentos necessários ao desempenho da auditoria, em especial quanto aos indicadores de saúde. Não permitiu sequer que se fosse protocolado na Secretaria de Saúde o ofício de apresentação da equipe, o que afronta o decreto, de 1995, que regulamenta o Sistema Nacional de Auditoria do SUS. Qual a razão dessa atitude?
Em momento algum a SES negou atendimento ou acesso à documentação solicitada pela DENASUS e, tampouco, houve negativa de protocolização de quaisquer documentos.
O que houve foi uma solicitação da Secretaria de Saúde para que a auditoria fosse feita 60 dias após a data estabelecida pelo DENASUS, uma vez que estávamos todos, naquele momento, extremamente envolvidos nas ações de enfrentamento da Gripe A, que comprometeu intensa e de forma prolongada, todos os recursos humanos da Saúde Pública estadual.
Diferente de outras dezenas de auditorias que o DENASUS faz regularmente no Estado, esta veio com a exigência de que tanto o Secretário quanto os Diretores ficassem à disposição dos auditores para receberem orientações. Diante dessas exigências inusitadas, pedimos que deixassem passar a onda da Gripe para terem o atendimento desejado. Eles não aceitaram o adiamento e vieram na data que haviam estabelecido.
Mesmo assim a equipe de auditores foi devidamente recebida na Secretaria Estadual da Saúde pelo Diretor adjunto do Fundo Estadual de Saúde e pela Coordenadora da Auditoria Estadual. Ambos prestaram todas as informações solicitadas.
Além disso, houve o recebimento nesta SES do ofício n.º 521/SEAUD/MS PI, que trata da apresentação dos auditores, inclusive com a protocolização do mesmo nesta Secretaria, no dia 15 de outubro de 2009, pela manhã, conforme consta no expediente administrativo n.º 090268.20.00/09.8.
As informações e os documentos solicitados pela equipe auditora, em seu comunicado de auditoria (CA), foram respondidos e fornecidos, com o encaminhamento devido, sejam os que estão ao alcance da SES, como os elaborados pela Secretaria Estadual da Fazenda do RS. Temos todos os documentos registrados e disponíveis caso haja interesse da revista.
2) Aplicação de recursos do SUS no mercado financeiro. Constatou-se haver aplicações da ordem de 164,7 milhões de reais, para rendimento de juros e correção monetária. Qual o objetivo de se tirar dinheiro do setor para aplicá-lo no mercado financeiro? Para quê são usados esses rendimentos?
Não existe nenhum Estado ou Município brasileiro que gaste de imediato os recursos repassados sempre existe um intervalo mais ou menos curto de tempo para seu uso. Também não há retirada do repasses do setor da saúde para aplicá-lo no mercado financeiro. Todos os gestores brasileiros, sejam estaduais ou municipais, conforme o estabelecido pela própria Constituição Federal, artigo 164, parágrafo 3º, e orientado pela Secretaria do Tesouro Nacional, através da Instrução Normativa n.º01 de 1997, são obrigados a depositar a quantia recebida do Fundo Nacional em conta bancária, e a aplicá-la no mercado financeiro imediatamente, até ser gasta. É vedada a utilização destas verbas e seus rendimentos respectivos em finalidade diversa da estabelecida, artigo 20 da referida IN:
§ 1º - Quando o destinatário da transferência for Estado, Distrito Federal ou Município, entidade a eles vinculada ou entidade particular, os recursos transferidos, enquanto não empregados na sua finalidade, serão obrigatoriamente aplicados:
I - em caderneta de poupança de instituição financeira oficial, se a previsão de seu uso for igual ou superior a um mês; e
II - em fundo de aplicação financeira de curto prazo, ou operação de mercado aberto lastreada em título da dívida pública federal, quando sua utilização estiver prevista para prazos menores.
§ 2º Os rendimentos das aplicações financeiras serão, obrigatoriamente, aplicados no objeto do convênio ou da transferência estando sujeitos às mesmas condições de prestação de contas exigidos para os recursos transferidos.
Essa aplicação financeira é uma forma de evitar a perda do valor econômico da importância transferida, pois nem todos os pagamentos e repasses são feitos de pronto, muitos deles estão vinculados à contraprestação de determinados serviços ou entrega de mercadorias e somente após o implemento desta obrigação é que poderá ser liberado o pagamento respectivo, tudo conforme estabelecido pela Lei Federal n. 8.666/93.
Se você fizer um levantamento do saldo bancário de repasses federais de qualquer gestor público de saúde no Brasil, repito: qualquer um, no dia de hoje, irá encontrar saldos volumosos que amanhã poderão não existir mais. Isso não significa que não estejam gastando de forma adequada e com responsabilidade! O mais importante não é o saldo do dia e sim o fluxo de caixa, que propositalmente nunca foi pedido pela auditoria.
3) De acordo com o Denasus, o governo do Rio Grande do Sul não repassa os 12% constitucionais para o setor de saúde. Em 2006, destinou somente 3,42%. Em 2007, 3,12%. Qual a razão do descumprimento da Emenda Constitucional 29/2000?
Segundo o Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul, ao aprovar as contas do Governo do Estado, nos exercícios de 2006 e 2007, há a aplicação no Estado dos 12%, uma vez que a EC 29/20000, ao estabelecer tal percentual para atender ações e serviços públicos de saúde, ou seja, não está restrito exclusivamente à Secretaria da Saúde, mas a todas as ações e serviços executados em todos os níveis do governo, haja vista o caráter transdisciplinar conferido à matéria. Ressalte-se, inclusive, que esta é uma das conclusões do Relatório do DENASUS , em seu item "e", fl. 27.
Mesmo quando o percentual é calculado exclusivamente pelas ações consideradas pelo CNS como de saúde Pública, o percentual aplicado pelo Estado é quase o dobro do que o relatado pela auditoria.
Para atender o que são gastos com ações de saúde previstas pelo CNS, é urgente que se aprove a regulamentação da emenda 29 no Congresso Nacional. Entretanto falta vontade política da maioria para fazê-lo. A bem da verdade nem o Governo Federal cumpre os gastos conforme previsão do CNS.
4) Em 2007, o governo do RS destinou somente 0,29% dos recursos para a vigilância sanitária. A vigilância epidemiológica recebeu, ao longo do mesmo ano, exatos 400 reais do tesouro estadual. No caso da assistência farmacêutica, não houve repasse algum. Por que há tanta restrição orçamentária nesses setores da saúde?
É inverídica esta afirmação do DENASUS, uma vez que os documentos apresentados aos senhores auditores demonstram que o total de recursos do Tesouro do Estado na ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA, no período de 2006 a 2009, é a quantia de R$ 459.023.349,56 (quatrocentos e cinquenta e nove milhões, vinte e três mil, trezentos e quarenta e nove reais e cinquenta e seis centavos) conforme a tabela:
ANO 2006 - TOTAL PAGO: R$ 77.615.405,02
ANO 2007 - TOTAL PAGO: R$ 94.038.375,91
ANO 2008 - TOTAL PAGO: R$ 153.313.528,15
ANO 2009 - TOTAL PAGO: R$ 134.056.040,48
TOTAL GESTÃO: R$ 459.023.349,56
Da mesma forma, também inverídica a afirmação de que não houve destinação de recursos do Tesouro Estadual para a área de Vigilância Sanitária, pois toda a aplicação dos recursos federais é sempre acompanhada da contrapartida estadual, de acordo com legislação vigente. Estas ações são comprovadas e têm sido supervisionadas regularmente pelo Ministério da Saúde, pela ANVISA, sendo também objeto de controle da Controladoria-Geral da União e do próprio DENASUS, sempre com aprovações. Além disso, não procede a informação de que houve destinação de apenas 0,29% dos recursos federais recebidos para a Vigilância Sanitária, conforme pode ser verificado na tabela abaixo, que traz os valores que ingressaram no Estado, os pagamentos realizados e a respectiva proporção de execução dos valores repassados:
Recursos Financeiros da Área da Vigilância em Saúde
Série Histórica da execução segundo ingresso anual dos recursos da área, SES/RS, 2006 - 2009
ANO / INGRESSOS / PAGAMENTOS / PROPORÇÃO DE EXECUÇÃO
2006 / R$ 10.463.738,73 / R$ 9.970.899,08 / 95,29%
2007 / R$ 10.452.219,53 / R$ 8.051.473,41 / 77,03%
2008 / R$ 9.781.102,17 / R$ 10.290.334,20 / 105,21%
Até junho 2009 / R$ 5.722.237,47 / R$ 6.490.631,26 / 113,42%
(Recursos 1477/1450)
Fontes: DATASUS FNS (repasses Fundo a Fundo) e FES/SES/RS
Cabe em relação a esta denúncia uma consideração de ordem política. Após a nomeação de um militante político gaúcho como Coordenador Nacional do DENASUS, contrariando uma prática institucional de lá colocar funcionários de carreira, ocorreu um aumento inusitado de auditorias no Estado, de forma quase a configurar uma intervenção na gestão estadual. Os Estados governados por partidos de oposição ao Governo Federal tem um número muito maior de auditorias que os demais.
Por mais de uma vez alertamos ao Ministro Temporão e ao Secretário Antônio Alves, da SEP, a respeito da postura pouco republicana e partidária do Diretor do DENASUS, particularmente em relação ao Rio Grande do Sul, onde tem sua base política. Esse assunto já foi colocado na pauta da próxima Assembléia do Conselho Nacional de Secretários da Saúde (Conass) para deliberação .
Essa postura política fica mais evidente nessa última auditoria, pela condução dada pelo referido Diretor na sua execução e forma final. Ele pessoalmente se preocupou em divulgá-la na imprensa e no Ministério Público, semanas antes de qualquer conhecimento e possibilidade de esclarecimento por parte da SES/RS, numa tentativa de criar, mesmo sem base fática, noticiário político de repercussão para o processo eleitoral que se avizinha. São os número eleitorais que objetivam, muito mais, enfraquecer eventuais adversários do que esclarecer ou resolver questões do SUS.
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NOTA DE ESCLARECIMENTO DO CONSELHO NACIONAL DE SECRETÁRIOS DA SAÚDE (CONASS)
O Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS) vem a público manifestar-se sobre o conteúdo da matéria "Remédios por juros", da revista Carta Capital na edição número 585, de 03 de março de 2010, de autoria de Leandro Fortes.
O CONASS entende que o referido texto não esclarece a opinião pública sobre a utilização de recursos financeiros do Sistema Único de Saúde (SUS) e apenas expressa opiniões e faz ilações sobre os procedimentos administrativos de determinados estados.
O Departamento Nacional de Auditoria do SUS (DENASUS) é vinculado ao Ministério da Saúde e, juntamente com as auditorias municipais e estaduais compõe o Sistema Nacional de Auditoria (SNA), numa relação institucional harmônica, mas não hierárquica. Portanto, a divulgação de informações relativas às auditorias deve observar a correta relação entre gestores do Sistema Único de Saúde (SUS), o respeito ao contraditório e o fluxo legal dos processos. É lamentável que tais cuidados não tenham sido observados no caso em tela e que o teor de parte das auditorias realizadas pelo DENASUS tenha sido repassado à imprensa sem a observância dos trâmites administrativos, que inclui entre eles o envio desses relatórios aos respectivos gestores para manifestação.
Os princípios do Direito Administrativo Brasileiro e a normativa que trata de convênios instam a aplicação de recursos públicos em mercado financeiro durante o período de não execução - prática em todas as unidades federadas e entendimento considerado adequado pelos Tribunais de Contas, legalmente responsáveis pela análise do desempenho do setor público. Tal ação não implica, como afirmado na reportagem, em "um recorrente crime cometido contra a saúde pública" e como tal não pode ser atribuído aos estados citados.
Quanto ao cumprimento da Emenda Constitucional 29 (EC -29), que define os percentuais da receita a serem aplicadas no SUS é atribuição das Cortes de Contas e não dos auditores do Ministério da Saúde. Salientamos que os gestores do SUS têm atuado fortemente junto ao Congresso Nacional para a regulamentação da EC-29.
O SUS é a materialização da conquista da sociedade brasileira ao direito a saúde e deve estar acima de quaisquer interesses. O CONASS defende as corretas utilização e fiscalização dos recursos públicos e a relação respeitosa e harmônica entre os gestores como forma de efetivar os princípios constitucionais do SUS.
Beatriz Dobashi
Presidente do CONASS